A raiz de toda história é o conflito, seja ele ideológico, físico ou interno. Como dissemos no post sobre os Sete Passos, um herói quer alguma coisa e precisa lutar para conseguir seu objeto de desejo.
Mas com quem ele luta? Quem ou o que está impedindo o herói de conseguir o que quer?
Em sentido oposto ao herói, temos o Antagonista (evito usar o termo “vilão” pois sempre me lembra o Dick Vigarista). Ele é o responsável por evitar que nosso herói consiga o que quer, e o embate entre os dois é o que fará nosso protagonista crescer e triunfar ou ser derrotado e destruído. Aí que mora o problema.
Se a força antagônica for grande demais e as chances do herói muito baixas, o escritor precisará de algum artifício (normalmente um deus ex machina) para solucionar o conflito, o que diminui a qualidade da obra. Se for pequena demais, a vitória do herói é garantida e o conflito deixa a desejar. É preciso a quantidade certa de equilíbrio e tensão para que essa relação deixe o leitor ansioso sobre o desfecho.
Tendo isso em mente, como podemos criar um bom antagonista?
É uma unanimidade entre os autores que um bom antagonista deve ser poderoso. Ao dar poder a ele, aumentamos proporcionalmente a dificuldade e pressão do herói, e com isso, a qualidade do conflito.
Vale lembrar que “poder” não se resume a força física, ou dinheiro infinito ou influência política. O poder do vilão deve ser inerente ao enredo, de forma que, dadas as situações da história, o antagonista tenha a capacidade de impor sua vontade sobre a trama, e ter vitórias ao longo do caminho.
Veja como o conceito de poder é amplo. Hannibal está preso e mesmo assim é quem detém todo o poder na negociação.
Lembra quando falamos de fraqueza nos Sete Passos? É aqui que o conselho de dar uma fraqueza para o herói realmente brilha, pois ajuda na definição de um antagonista.
Você deve dar ao antagonista a capacidade de atacar a fraqueza do herói, seja ela qual for. Dessa forma, o conflito se desenvolve fácil, e o antagonista terá a vantagem inicial. Caso seu herói não tenha uma fraqueza clara, faça seu antagonista criar situações onde a força do herói não tenha serventia. Ou então faça o antagonista transformar uma de suas virtudes ou forças em fraqueza. Isso pode parecer difícil à primeira vista, mas um exercício que ajuda bastante é elevar uma das qualidades do herói até o limite, onde uma característica boa se torna problemática.
Um exemplo simples: se um dos pontos fortes de seu herói é a confiança na justiça, até onde vai sua bússola moral se um ente querido for acusado de um crime? Um antagonista esperto poderia forjar uma situação onde os indícios de um assassinato apontam como culpada a esposa do herói. O que o seu herói faria?
Repare que mesmo Batman sendo mais forte e tendo o dominio físico da situação, é o Coringa quem dá as cartas e demonstra o quão inútil é a força física de seu oponente.
Um dos problemas mais comuns em histórias é o sumiço do antagonista. O personagem surge, apresenta algum desafio para o herói, e some pelo resto do enredo, só surgindo no final para ser batido pelo personagem principal.
O conflito entre herói e antagonista deve ser (mesmo que não pessoal) constante e árduo. Essa é a relação mais importante da história e a que mais dá chão para o crescimento do herói. A luta entre os dois deve ter sempre o objetivo de desafiar o herói, no sentido de aumentar a sua vontade de cumprir seu desejo ou o fazer duvidar de suas habilidades.
Um das muitas vantagens de se manter o antagonista presente é para forçar o herói a tomar decisões, especialmente decisões difíceis. A razão para isso é que a melhor maneira de mostrar a real essência de um personagem é através das decisões que ele toma, e, quanto maior a pressão que o força, mais reveladora é a decisão.
2001, Uma Odisséia no Espaço. Hal tem total controle sobre a vida e morte dos tripulantes a bordo. Note a tensão entre as pessoas, começando a perceber que não podem confiar no seu super computador.
Essa é a cereja do bolo de um bom antagonista. Ele deve ter uma motivação própria, claro, para evitar que ele seja “mau por ser mau”, mas o melhor objetivo que esse personagem pode ter é o mesmo do herói.
Normalmente a dinâmica entre os dois personagens é “Herói quer algo e antagonista o impede” ou “Antagonista quer algo e herói é o único que pode impedi-lo”. Isso é bacana e ótimas histórias foram escritas com essa temática, mas isso sempre corre o risco de criar um antagonista (ou herói…) genérico. Dando ao antagonista o mesmo objetivo do herói, ambos competem ao longo da história para conseguir o que querem, e a maneira como realizam essa busca é o maior divisor de águas entre suas personagens, inclusive dando margem para o herói se perguntar se os seus modos são os corretos. Bom lembrar que esse objetivo não precisa ser concreto. Pode ser algo abstrato, contanto que tanto o herói quanto o vilão tenham consciência ativa dele.
Herói e antagonista podem estar duelando por um copo plástico ou um império, porém quanto mais profunda a luta e relação entre eles, mais engajante é a história. Isso significa que devem se enfrentar tanto no campo físico, quanto no psicologico e, idealmente no moral.
Uma enfermeira quer um livro. Um escritor quer ir para um hospital. Qual é o real objetivo que cada um tem?
Se você for seguir somente uma dica minha, que seja essa: leia Misery, Louca Obsessão, por Stephen King.
Espero que você tenha aprendido as regras para criar um grande antagonista. É metade do caminho para você ter a história feita.
John Truby – The Anatomy of Story
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