Todo manual de escrita lhe dirá que a regra básica para uma boa história é ter personagens que cresçam com os acontecimentos. A história e seus eventos devem ter efeito no personagem e este deve influenciar e agir sobre o desfecho da história, existindo assim evolução de personagens e narrativa.
Inclusive, a regra de que “é preciso que o personagem evolua/mude” é uma das mais difundidas em qualquer análise mais profunda sobre uma obra. Oficinas de escrita criativa focam nesse quesito e no quanto ele é necessário para engrandecer sua história.
<figcaption id="caption-attachment-788" class="wp-caption-text">“…não é EXATAMENTE disso que eu estou falando”</figcaption></figure>
O problema é que nem sempre é dito como gerar e demonstrar essa mudança. Descrever os sentimentos durante a narrativa pode parecer forçado, bem como expor tal mudança em diálogos.
A melhor maneira de demonstrar que um personagem mudou ou evoluiu é através de suas decisões definitivas. Quando o personagem toma uma decisão conflitante com suas crenças iniciais, fica claro para o leitor que o personagem evoluiu.
<figcaption id="caption-attachment-789" class="wp-caption-text">Quando o Batman decide não se entregar, por confiar em Harvey Dent, ele toma uma decisão conflitante com o que achava correto</figcaption></figure>
Além da tomada de decisão voluntária, outra forma importante para forçar a mudança em um personagem é ter algo que conflite com suas crenças lhe sendo imposto. As vezes, o mundo (ou, idealmente, o vilão) força uma situação que obriga o personagem a analisar sua vida.
<figcaption id="caption-attachment-790" class="wp-caption-text">O exato momento em que Jaime Lannister deixa de ser um vilão</figcaption></figure>
Um ótimo exemplo de evolução de personagem pode ser visto ao longo da obra O Senhor dos Anéis. Frodo e Sam tomam decisões dificeis e mostram o quanto evoluíram ao longo da trama.
Quando o Conselho de Elrond se reúne para discutir o futuro do Um Anel, Frodo é apenas o portador que trouxe a relíquia até o lugar. Sua presença é mera formalidade e uma espécie de agradecimento pelo serviço prestado. O próprio Frodo comenta com seus amigos hobbits que sua jornada já terminou e que ele deseja voltar para casa. Porém, ao ver que as demais pessoas reunidas não chegam a um consenso do que deve ser feito, se voluntaria para levar o Anel a sua destruição. Tal decisão, indo contra suas próprias vontades, é a primeira mudança real que vemos em Frodo, de um expectador para um ator em sua jornada.
Ainda no primeiro filme, quando Boromir trai a confiança da Sociedade do Anel, Frodo percebe que a influência corruptora do artefato terminará por eliminar todos os membros da Sociedade. Por isso ele decide continuar o caminho sozinho, deixando seus guardiões para trás, mesmo temendo o caminho e suas privações.
Vemos nessa mesma cena, Sam tomando a decisão de seguir com Frodo, mesmo contra sua vontade, demonstrando a lealdade que tem com o Portador do Anel.
Influenciado por Gollum, Frodo obriga Sam a ficar para trás, acusando o amigo de roubar a comida que tinham guardado. Vemos aqui um dos “vilões” forçar o herói a tomar uma decisão, mostrando que o próprio Frodo está ficando desconectado com o mundo, graças a influência do Um Anel. Vemos também Sam reforçando sua lealdade ao voltar a companhia de Frodo, salvando-o da morte certa e lhe retornando o Anel. Não é propriamente uma decisão nova, visto que Sam já tinha como traço de personalidade seu apoio a Frodo, mas o reforço também serve para enraizar os traços do personagem.
Importante: na boca da Montanha da Perdição, Frodo (tal qual o rei Isildur do passado) decide não destruir o Anel. A influência do objeto poluiu de tal forma a alma de Frodo que ele foi corrompido e deseja mantê-lo consigo. Graças a uma intervenção desastrosa de Gollum, o Anel é destruído.
Mesmo após o término da busca, vemos Frodo apático e distante. Os efeitos da corrupção do Anel são duradouros e ele não parece ficar satisfeito com nenhuma das ações que lhe ocorrem após os acontecimentos da aventura. Frodo só volta a ficar feliz quando toma a decisão de partir com os Elfos. É possível ver isso quando ele sobe no barco e, ao olhar para os amigos, dá o primeiro sorriso sincero desde a destruição do Um Anel.
Os personagens só evoluem e crescem quando, ou tomam decisões conflitantes com suas crenças, ou quando tem algo de impacto que lhes é imputado. Tenha isso em mente quando tentar escrever sua próxima história!
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