Vimos no nosso post sobre Antagonistas que uma das funções do vilão é impedir que o herói atinja seu objetivo engrandecendo o conflito e história. Além disso, vimos que idealmente o vilão deve competir pelo mesmo objetivo de herói para alcançar máximo conflito.
Mas também falamos que seria interessante manter o debate em todos os campos possíveis: físico, psicológico e moral. E que o vilão deve manter a pressão no herói ao longo da história. E que deve ser capaz de identificar e atacar a fraqueza do herói. E seja ativo. E que não seja monotemático.
E, claro, seja cativante.
Quando começamos a idealizar tal vilão, é possível perceber que existem muitos atributos que ele deve cumprir, e que criar um personagem tão multifacetado por vezes não é possível ou desejável. Na tentativa de cumprir todos os requisitos, um dos desfechos é criar um antagonista que faça todas essas tarefas mas de maneira ineficiente.
Outro ponto delicado é a possibilidade de criar um enredo genérico ao tentar um único conflito profundo. Se todos os mocinhos são a favor do herói e todos os bandidos são a favor do vilão, por mais complexos que sejam os personagens envolvidos, você terá a hercúlea tarefa de evitar que tal cenário caia num “As forças do Bem vs As forças do Mal”.
Um dos métodos para atacar esse problema é aumentando o número de oponentes. Colocando mais personagens em confronto torna mais claro o conflito e o tema central da obra, além de adicionar camadas de complexidade. A ideia não é simplesmente aumentar o número de antagonistas contra o herói, mas aumentar o número de competidores, ou seja, mesmo que os novos competidores estejam contra o herói, eles também estão contra os demais.
<figcaption id="caption-attachment-458" class="wp-caption-text">Game of Thrones: mesmo que o dilema central não esteja plenamente claro, é óbvio que o conflito entre vários personagens engrandece a história</figcaption></figure>
Um conceito que facilita muito a criação de tais personagens é a Oposição em Quatro Pontos. A ideia é confrontar o dilema moral de seu herói por vários pontos de vista opostos e, através dessa diferença de visão, gerar o conflito com cada um deles, e mesmo entre eles. Com isso é possível aprofundar o tema da obra e manter a fluidez da história.
É complexo explicar a ferramenta sem dar exemplos, por isso vamos tentar um bem claro.
O público é unânime em apontar o segundo filme da trilogia de Christopher Nolan como o melhor de todos, mas o primeiro usa muito bem a técnica da Oposição em Quatro pontos.
Após receber o treinamento que o torna apto a cumprir seu destino, Batman enfrenta três inimigos com visões de mundo e métodos bem específicos e diferentes para atingir seus objetivos.
Carmine Falcone utiliza seu dinheiro e seu poder para conseguir ganhos pessoais e maior acúmulo de poder. Faz uso das engrenagens do crime e da violência para engrandecer o próprio império.
Jonathan Crane utiliza seus conhecimentos médicos para punir criminosos e conseguir prestígio e ganhos pessoais.
Ra’s Al Ghul e a Liga das Sombras acredita que, de tempos em tempos, é necessário um grande sacrifício populacional para garantir o correto curso da história.
Batman acredita que, com as instituições fragilizadas, é sua responsabilidade combater o crime para garantir a sobrevivência da sociedade.
Note que há um claro embate de visões de mundo e motivações. Ra’s Al Ghul e Batman possuem o mais profundo conflito (o desenrolar da história deixa isso claro), mas é impossível ignorar a luta de Falcone contra o herói. Ou de como Crane é, no fim das contas, o responsável pela destruição de Falcone. Ou do descaso de Ra’s Al Ghul com o psiquiatra, julgando-o inferior por buscar ganhos pessoais.
Ao fazer Batman vencer todos, Nolan deixa claro que o tema da história é que o poder e a violência só podem ser exercidos sem interesses pessoais e sem derramamento de sangue inocente. A regra é tão forte que Batman cria seu código de honra (nunca matar) para se distanciar da visão simplista da Liga das Sombras e de Ra’s Al Ghul.
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